Os cafajestes
É difícil encontrar uma boa matéria que combine esporte e política. Aqui vai a raridade:
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Por Daniel Sant'Anna
Original em MSM
Imaginemos por um instante um hipotético herói do esporte, nascido nos EUA, e que represente seu país numa competição internacional. Numa Olimpíada, por exemplo. Esse atleta, lançando mão de perfídia, voluntariamente, trapaceia num jogo do campeonato. Sua trapaça é reconhecida internacionalmente, e é a partir dela que a vitória de seu país é construída.
Voltando à realidade, é praticamente impossível imaginar que um atleta orgulhosamente desonesto fosse recebido e congratulado nos EUA como herói. Impensável, também, que esse mesmo atleta norte-americano cometesse sucessivos erros, como atleta e como homem, e que apesar disso aumentasse sua fama de herói por décadas a fio. Não, esse país não poderia ser os EUA. Esse país só poderia ser a Argentina.
A maior importância social do esporte é seu papel como representação simbólica da vida. Como um filme, um jogo de futebol encena em 90 minutos temas mitológicos e pode servir para que uma comunidade inteira, ou mesmo um país, reflitam a respeito de sua própria natureza. A função do esporte é, acima de tudo, educativa: a partir de exemplos dados e vividos dentro de campo, podemos construir nosso caráter e enxergar as mesmas situações transpostas para nossa vida e cotidiano. Quem já esteve na arquibancada de um estádio de futebol sabe que, independente de simplificações sociológicas ou mesmo acima dessas, torcer é, especialmente, sonhar o mesmo sonho na companhia de desconhecidos.
Diego Maradona parece não se contentar em ser simplesmente um ex-jogador de futebol. Hoje, é uma personalidade interessada em militar politicamente. É amigo do ditador venezuelano Hugo Chávez, do ditador cubano Fidel Castro, e assim sucessivamente. E, como bom ator desse teatro ridículo, não perde uma oportunidade em falar mal de George W. Bush.
Em sua recente visita ao Brasil, Maradona deu exemplo: embebedou-se, saiu à cata de mulheres brasileiras e brigou com a polícia. Assim como Mike Tyson, outro exemplo e fã confesso de Che Guevara: em visita a este país oprimido de Terceiro Mundo, não tardou em correr atrás de nossas... prostitutas. Ao contrário dos capitalistas norte-americanos maus, que querem nossa água, nossas ervas e todas as outras riquezas naturais de que dispomos, Maradona e Tyson estão interessados, especialmente, no sexo barato oferecido por prostitutas brasileiras.
O maior lance da vida esportiva de Maradona foi uma trapaça: ele fez um gol com a mão, no famoso jogo contra a Inglaterra. Esse ato poderia ser interpretado por um sociólogo latino-americano como uma vingança simbólica pela Guerra das Malvinas, ou por séculos de exploração imperialista. Maradona seria, assim, o herói dos pobres, dos injustiçados, de todos os latinos baixinhos de cabelos escuros passados para trás desde que alguém de cabelos loiros aportou em nosso litoral.
Na Copa do Mundo seguinte, contudo, Maradona e sua tropa trapacearam de novo. Dessa vez, contra seus hermanos, no caso nós, brasileiros. Foi o não menos célebre episódio da “água batizada” ou “boa noite, Cinderela”: atletas argentinos ofereceram a seus companheiros explorados, brasileiros, água que sabiam estar adulterada com sonífero. O resultado: zagueiros brasileiros embobados e uma nova vitória argentina baseada em trapaça.
Ao comentar sobre o episódio, até hoje, Maradona ri. Se ri de nós em suas conversas reservadas com Chávez ou Fidel, jamais saberemos. O que sabemos, contudo, é que o episódio ecoaria, 15 anos depois, na atitude de Carlitos Tevez, que come e dorme São Paulo, pois é jogador do Corinthians, mas não pensou duas vezes em cuspir na água a ser oferecida ao técnico de nossa seleção de futebol, Carlos Alberto Parreira. Semi-analfabeto, Tevez mal sabe o que faz. Como um cãozinho de reflexos condicionados, ao ouvir a palavra “Brasil”, ele simplesmente faz o que lhe ensinaram: cospe. Curvada aos pés do atleta argentino, a mídia brasileira pouco reclamou: ao que parece, era tudo que podíamos esperar de nosso hermanitos igualmente explorados. Afinal, o que importa é que temos um inimigo comum: o imperialismo norte-americano. Abaixo a ALCA, e viva o Mercosul.
Maradona, Tyson ou Tevez pouco poderiam ser condenados por suas atitudes; assim como Chávez, que manda a ALCA al carajo, deles se esperaria muito pouco de melhor ou de diferente. Agem como deveriam agir, e como se acostumaram a agir e ser recompensados por isso. Como dizia um amigo meu, em sua simplicidade e sabedoria insuspeita, eles estão certos; errados estão aqueles que os apóiam. Habitantes do país do futuro, errados somos nós por suportar tudo isso e ainda lhes dar crédito, fama, hospedagem, ribalta e ouvidos. Estamos pegando carona no bonde errado da história, naquele que vai para a direção oposta, naquele que só se movimenta em marcha ré. Problema nosso se não temos sequer vergonha na cara. Fazendo de seu discurso carcomido de esquerda sua melhor propaganda, eles são apenas cafajestes. Otários somos nós.
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