martes, 24 de agosto de 2004

A irmandade chavista

por Diogo Mainardi (comments on this article in spanish)

Sessenta e oito intelectuais e artistas brasileiros assinaram o manifesto "Se fosse venezuelano, eu votaria em Chávez". Os nomes de sempre: Oscar Niemeyer, Celso Furtado, Antonio Candido, Leonardo Boff, Chico Buarque, Augusto Boal, João Pedro Stédile, Beth Carvalho. Não sei se os venezuelanos consideram Beth Carvalho uma intelectual ou uma artista. Também não sei quantos votos seu apoio rendeu a Hugo Chávez.

Os intelectuais e artistas brasileiros não perdem ocasião para assinar manifestos. O decano da categoria é Oscar Niemeyer. Assinou praticamente todos os manifestos que surgiram nos últimos anos. Do que condena a guerra no Iraque ao que repudia a autonomia do Banco Central. Do que defende o MST ao que pede a reabertura das investigações sobre o assassinato de Toninho do PT, prefeito de Campinas. Pena que os intelectuais e artistas brasileiros não tenham pensado em assinar um manifesto pedindo uma CPI sobre o assassinato de Celso Daniel, prefeito de Santo André. Esperemos que seus pares venezuelanos tomem essa iniciativa.

Oscar Niemeyer, Chico Buarque e João Pedro Stédile assinaram um manifesto de solidariedade a José Dirceu, abalado pelo caso de corrupção em seu ministério. Os mesmos Oscar Niemeyer, Chico Buarque e João Pedro Stédile assinaram um manifesto de solidariedade a Cuba, depois que o regime de Fidel Castro mandou matar uns miseráveis que roubaram um barco para tentar fugir do país.

Os intelectuais brasileiros formam uma espécie de irmandade. Entre os signatários do manifesto de apoio a Chávez, encontram-se tanto Carlos Heitor Cony, agraciado com uma aposentadoria milionária pela Comissão de Anistia, quanto Marcelo Lavenère, presidente da mesma comissão. Outros dois intelectuais que manifestaram apoio a Chávez foram Fernando Morais e Guilherme Fontes, respectivamente autor e diretor de Chatô. Guilherme Fontes, por causa do filme, passou os últimos tempos defendendo-se de acusações de irregularidades no uso de verbas públicas. Fernando Morais passou os últimos tempos defendendo seu padrinho político, Orestes Quércia, de acusações semelhantes.

Um dos mais entusiasmados signatários do manifesto chavista foi o bispo Tomás Balduino. Ele pregou "a mística bolivariana", por sua "coragem de enfrentar o império americano", da mesma maneira que pregou, no passado, a invasão de terras produtivas e o saque a supermercados. Tomás Balduino foi um dos promotores do fracassado plebiscito da dívida externa. Ultimamente, passou a recolher adesões para um plebiscito contra a Alca. Muitas das personalidades que assinaram o manifesto chavista assinaram também, um ano atrás, uma carta aberta a Lula, alertando-o contra a Alca e seu projeto neoliberal, que condena o Brasil a pagar juros apenas "para saciar credores insaciáveis". Preocupados com os rumos da cultura, os intelectuais e artistas aproveitaram para lembrar o presidente de que a nação não pode "entregar ao mercado a formação de sua juventude". Lula continuou a pagar juros aos credores. Em compensação, intelectuais e artistas ganharam cargos públicos e projetos de lei para o controle de imprensa e cinema.

Se eu fosse venezuelano, votaria contra os brasileiros.